Uma heroína brasileira
No Dia da Mulher, repito homenagem a dona Francisca de Souza e sua saga de mãe solo a criar um filho numa favela.
A cearense Francisca de Souza é uma trabalhadora, analfabeta, mãe solo, moradora no Morro Santa Marta, no Rio. Numa reportagem na tevê[1], ela contou sua saga para criar o filho Amaury:
– Eu sou mãe e pai, desde que ele nasceu. Você não imagina a gente criar um filho numa favela. Eu era uma mãe desesperada. Ele chegava da rua, eu cheirava a roupa dele. Antes dele sair, eu olhava a mochila dele todinha. Tinha medo dele se envolver… você sabe, né? Se eu visse que tava entrando… ia ser no cacete, ia ser mesmo.
Assim, em poucas palavras, ela desvenda, calmamente, um drama extensivo a milhões de mulheres, Brasil a fora.
Sabia que a educação era uma das poucas vias para a salvação do rapaz. Instintivamente, deduzia que um livro, esse objeto misterioso, poderia ser a porta para um mundo melhor. Mas não tinha dinheiro pra comprar um. Até que um dia criou coragem e falou pra patroa:
– A senhora não tem um livro aí pra ele ler, não? Ela disse: pode levar o tanto que você quiser. Eu até chorei de alegria nesse dia, sabe?
Felizmente, o rapaz foi fisgado pelos livros e se enfiou nos estudos. Na pequena casa em que vivem na favela, não tem janelas, mas tem uma estante estufada. Hoje, ele contabiliza que lê uma média de 5 livros por mês, ou 60 por ano.
– Quando ele tinha um curso pra fazer, se fosse muito caro, eu ia lá, contava pra pessoa a minha situação, chorava, até que aquela pessoa dona do curso se comovia…
Resultado: o filho está numa Faculdade de Cinema e já faz alguns trabalhos profissionais, melhorando a renda da família.
É bonita a maneira como ele retribui o esforço da mãe, falando assim:
– Quando fizemos o vestibular…
O plural aí é ele e Francisca.
Essa é minha homenagem à mulherada, no seu dia.
[Publicado originalmente neste blogue em 08 de março de 2022]