Uma estreia n’ O Pasquim
Foi aí que o camarada publicou seu primeiro texto. Apenas.
Em 1974, quando tinha 22 anos, Geraldo Sobreira estudava Ciências Sociais e precisava ganhar a vida, no Recife, onde então morava. Estava casado, tinha um filho pequeno e outra a caminho. Procurava algo melhor que os empregos precários disponíveis.
Aconselhado pelo amigo RAL, exímio cartunista falecido ano passado, escreveu uns aforismos salpicados de humor e mandou para O Pasquim, sensação da imprensa brasileira nos anos 1970.
Mandou 12 frases, publicadas na íntegra na coluna Picles. Foi o primeiro texto seu pelo qual recebeu uma remuneração. A partir daí seguiu uma exitosa carreira jornalística. Isso faz 51 anos hoje.
O Pasquim, nº 237, 15 a 21 de janeiro de 1974.
PICLES
Era um homem de ouro, a mulher tinha os nervos de aço. Mas nem chegaram às bodas de prata.
Era um homem de ideias. Por isso, fez sua mulher perder a cabeça.
Confusão de parentesco: a mãe da indústria é a matéria prima.
Estava sempre a provocar tempestades. Era um cabeça de vento.
Lia com avidez o novo e o velho testamento: sonhava com heranças.
Era um homem de peito. Por isso, vivia envergonhado.
Procurava sempre em vão compreender sua incompreensão.
Falava de si próprio com muita propriedade, o latifundiário.
Está sempre a encher os outros. Pois é muito cheio de si.
A bomba de Hidrogênio espera a de Oxigênio pra inaugurar a Era de Aquarius.
Na queda, perdeu toda a gravidade.
Indigesto é engolir desaforo por razões de estômago.