Um ícone nacional humilhado

BLOGUE DE HOMERO FONSECA
2 min readNov 24, 2023

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Vilma Nascimento, que formou com o primo Benício a lendária dupla de porta-estandarte/mestre-sala da escola de samba Portela, é a mais nova vítima do racismo no Brasil.

Vilma e Benício, ícones do Carnaval e do Brasil, nos gloriosos anos de desfile pela Portela.

Era 1969 quando estourou em todo o Brasil, na voz jovial de Jair Rodrigues, o samba “O conde”, contando uma história de amor de um sambista abandonado que se consola ao desfilar pela escola do coração, a Portela. Quem, nos anos 70, não cantou, nos bares e nas festas, os célebres versos: “Como é / Que eu posso por ela trocar / A emoção de ver Vilma dançar / Com o seu estandarte na mão / E ouvir todo o povo meu povo aplaudir / Minha escola a evoluir / Minha ala comigo passar”?

Os autores da composição — Jair Amorim, jornalista capixaba, e Evaldo Gouveia, violonista cearense — formavam uma dupla responsável por alguns dos maiores sucessos da música popular brasileira, gravados pelo cantor Altemar Dutra (“O trovador”, “Brigas”, “Bloco da solidão”) e mais um time onde se incluem Aguinaldo Rayol, Ângela Maria, Anísio Silva, Gal Costa, Miltinho, Milton Nascimento, Nélson Gonçalves, Rosana, entre outros.

A personagem do verso “A emoção de ver Vilma dançar” é a carioca Vilma Nascimento, de 83 anos, que ontem (quinta-feira, 23/11/2023), foi coagida e humilhada numa dessas lojas de importação livre no Aeroporto de Brasília. Ela voltava para o Rio, depois de haver sido uma das personalidades homenageadas na Câmara dos Deputados no dia anterior, no marco do Dia da Consciência Negra. Ela e a filha Danielle, que comprara chocolates na loja, foram abordadas por uma fiscal e constrangidas a abrirem as bolsas diante do público, acusadas de furto. Danielle contou que a fiscal acusou-a de não haver pago a mercadoria e recebeu uma instrução pelo rádio para também revistar a bolsa da mãe. Do alto de sua dignidade, a octogenária Vilma disse que só abriria a bolsa na presença da Polícia. Como a Polícia não chegava, a filha convenceu a mãe a mostrar seu conteúdo, pois estavam na iminência de perder o voo. A família vai levar o caso à justiça. Uma pá de artistas, entidades e políticos se solidarizaram com as duas e denunciaram o caso como racismo.

Paulinho da Viola declarou: “Foi com dor e indignação que vi o vídeo dessa cena lamentável. (…) Eu também me sinto ferido.”

A Escola de Samba lançou nota, afirmando: “A luta por uma sociedade mais justa e humana passa pelo combate ao racismo. (…) É uma sambista de destaque, que traz na pele a marca de nossa ancestralidade.”

É por isso que constatamos: a abolição da escravatura ainda não foi concluída no Brasil.

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Jornalista e escritor. Só sei que nada sei (Sócrates), mas desconfio de muita coisa (Riobaldo Tatarana).

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