Confissões de um hímen
Homero Fonseca
Sou um velho hímen aposentado, após 20 anos de serviço. Hoje a moçada está se aposentando aos 15/16 anos.
Na ativa, fui o guardião fiel da honra da minha dona. Ela era das antigas, a chamada moça casadoira. Desde cedo, aprendeu que a virgindade era seu tesouro mais precioso e eu, o último baluarte em sua defesa. Eu era importante. Atualmente não se fala nem em nosso nome, a não ser nas aulas de medicina forense.
Minha dona, à certa altura, começou a ter uns comportamentos estranhos. Arranjou um amigo — que se chamava Namorado, mas depois mudou o nome para Noivo — cujo passatempo mais notório era rondar a gruta que eu guardava com tanto afã.
Foi ela própria, a ingrata, que no dia do seu casamento me deu a notícia da minha imolação. Seu amiguinho tinha arranjado um salvo-conduto assinado por um padre e um juiz. Tentei resistir, mas tombei numa arena ensanguentada.
Depois desse Dia D, distraía-me assistindo de camarote à intensa visitação à caverna que eu guardara, por parte do tal amigo, agora chamado Marido. Era realmente uma coisa espantosa! Três visitas ao dia! Com tempo, essas entradas foram se reduzindo: para uma visita diária, depois semanal, depois mensal, por fim raramente. Um dia cessaram completamente. Alguns anos depois, quando eu nem mais me lembrava do assunto, o movimento recrudesceu e era mais intenso do que antes. Só que o visitante era um desconhecido. Depois ele sumiu. Apareceu outro, no mesmo ritmo. E outros. Identifiquei um padrão: frequentação intensa, por curto tempo e ciao. Pareciam até turistas. Agora parou tudo de vez. Resta-me o tédio.