Confederação do Equador

BLOGUE DE HOMERO FONSECA
3 min readJul 2, 2024

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Comemoram-se hoje 200 anos da revolução. Lembro um advogado, poeta e jornalista revolucionário, dos menos visíveis entre os seus líderes.*

Porto do Recife nos começos do século 19. Acervo Biblioteca Nacional.

“Saldanha é um dos revolucionários mais atrevidos do mundo”. Assim o embaixador francês em Londres, em carta datada de 25 de março de 1825, dirigida ao seu ministro do Exterior, classifica o republicano radical José da Natividade Saldanha, um dos principais líderes da Confederação do Equador, mais radical ideologicamente que Frei Caneca e menos visível na historiografia.

Basta dizer que seu livro de cabeceira era Direitos e Deveres do Cidadão, do pensador francês Gabriel Bonnot de Mably, que questionava, por exemplo, a legitimidade da propriedade privada.

Saldanha era mulato e filho do padre João José Saldanha Marinho, vigário de Sirinhaém, com uma mulher negra, identificada apenas como Lourença. Tinha tudo contra si, menos uma inteligência privilegiada e uma esmerada educação proporcionada pelo pai. Formou-se em Direito em Coimbra em 1823. Quando voltou para o Recife, Pernambuco estava pegando fogo com a oposição ao governo autoritário de dom Pedro I, o que desembocaria na Confederação do Equador. Em janeiro de 1824 ele assumiu o cargo de secretário do Governo Provisório presidido por Manuel de Carvalho Paes de Andrade, eleito à revelia do imperador.

Ele resolveu doutrinar as massas, fundando o jornal Argos Pernambucano, que teve apenas seis números, entre 31 de maio e 11 de agosto de 1824. Nele, defendeu teses como: o imperante não é mais que um simples executor da vontade da nação”. Pode haver fala mais subversiva à época, negando o direito divino e vendo o imperador como um simples barnabé de alto cargo? Era insolente mesmo o rapaz.

Como a História registra, a gloriosa revolução foi derrotada pela fulminante reação do governo imperial, cujas tropas entraram no Recife em 12 de setembro, acabando a festa da liberdade. Frei Caneca foi preso e fuzilado, tornando-se um mártir do movimento. Saldanha, como outros líderes, conseguiu partir para o exílio, passando por Paris e Londres, onde era monitorado pela espionagem francesa, aliada do império do Brasil. Daí o informe do embaixador: “Ele é um dos revolucionários mais atrevidos do mundo”.

Natividade Saldanha fixou-se na Colômbia, sob a tutela do general Simon Bolívar, o Libertador. E lá, depois de se meter com os revolucionários sul-americanos, morreu em 1832 em circunstâncias prosaicas, dando origem a várias lendas.

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* Extraído de A imprensa na Confederação do Equador, livro que estou terminando de escrever.

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Jornalista e escritor. Só sei que nada sei (Sócrates), mas desconfio de muita coisa (Riobaldo Tatarana).

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