Ciladas e dilemas da internet

Um caso de chantagem emocional mostrando que viver é perigoso mesmo no ambiente virtual.

BLOGUE DE HOMERO FONSECA
2 min readMay 4, 2021
A atriz Sue Lyon, no papel título do filme “Lolita” (1962), de Stanley Kubrick, baseado em Nabokov.

Um amigo me contou haver se deparado com uma garota nas redes sociais, que gostava de ler e sabia de cor versos de Fernando Pessoa. Pelo perfil, ela era da mesma cidade dele, tinha 18 anos e pretendia fazer o curso de Letras. Foi grande a afinidade e, apesar de ele ser bem mais velho, as mensagens trocadas em espaço reservado evoluíam para algo mais. Foi quando veio a revelação bombástica: a garota, na verdade, era um garoto, e estava perdidamente apaixonado pelo cidadão. E começou a pedir o número do telefone, acenando um encontro. Meu amigo não é preconceituoso, mas seu objeto de desejo são as mulheres. Começou a tirar o corpo aos poucos, mas a reação foi inesperada: o rapaz ameaçou suicidar-se se ele não lhe desse o telefone. O dilema custou algumas noites de sono: era uma chantagem emocional, claro, mas haveria algum perigo real de acontecer o tresloucado gesto? Ao mesmo tempo, se cedesse à chantagem, meu amigo sabia que era grande a chance de sua vida virar um inferno. Pesando os prós e contras, resolveu não ceder e bloqueou o outro. Passou uns dias vendo aflito o noticiário local das tevês, na expectativa da notícia do suicídio de um jovem. Nada aconteceu e a vida seguiu.

Lembrei dessa história algo dramática num episódio me acontecido, dias desses. Uma guria postou no meu Messenger: “Oie”. Dei uma olhada no perfil: gaúcha, bonita, bem fornida, shortinho e decotão. E o detalhe: 15 aninhos. Isso pode dar cadeia, pensei, e calado estava calado fiquei. Poucos dias depois, a pergunta: “Por que você não me responde?” Contra-perguntei: “Que queres tu de mim, menina?” E ela: “Quero te conhecer.” Então, respondi: “Sou velho, pobre e moro no Nordeste”. Ela, então, arrematou: “Sim, mais nada a ver”. E tudo se tornou um não-episódio, para meu alívio.

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Jornalista e escritor. Só sei que nada sei (Sócrates), mas desconfio de muita coisa (Riobaldo Tatarana).

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