A profecia

Há um ano atrás, falando sobre as perigosas relações entre o bicho humano e a natureza, o escritor Rodrigo Lacerda prediz um cataclisma e só falta pronunciar o nome “novo coronavírus”, de que ninguém tinha ainda ouvido falar.

BLOGUE DE HOMERO FONSECA
2 min readJun 7, 2020
Ilustração da capa de “Reserva natural”, de Rodrigo Lacerda

Escritores não raro dão uma de profeta. Nada a ver com o conceito vulgar de adivinhação. Mas sim a uma sensibilidade apurada que, quando se junta ao estudo, pode produzir antecipações quase mal-assombradas. Isso vale para todos os campos artísticos. A célebre frase do poeta Ezra Pound resume com brilho: “O artista é a antena da raça”.

‘Garrei a pensar nisso ao me deparar com uma entrevista do romancista e contista Rodrigo Lacerda ao jornal Cândido, de Curitiba, de junho de 2019. No livro de contos Reserva natural, o escritor carioca procura aproximar a natureza e o ser humano, esse bicho desgarrado. O projeto levou-o a mergulhar no tema das relações perigosas entre nossa espécie e a Mãe Terra e, na volta à tona, veio com uma visão clara e catastrófica. Daí suas palavras espantosamente proféticas na referida entrevista, que compartilho aqui:

“A humanidade caminha para o cataclisma. Acho que vai ter uma mortandade, não será a primeira — como a peste negra, na Idade Média, a gripe espanhola, no século XIX, três quintos da população mundial morreram. Caminhamos para uma coisa assim, porque não estamos conseguindo reverter o estrago que estamos fazendo no planeta. Isso para mim é um ponto pacífico. Inclusive estamos regredindo, né?

Políticos como o Trump, como o próprio Bolsonaro… Mas, verdade seja dita, os nossos governos de esquerda também não foram bons na área do meio ambiente. Não por acaso, a Marina Silva, o Fernando Gabeira, pessoas que eram muito ligadas à questão do meio ambiente, abandonaram os governos do PT muito antes desses governos acabarem. Então, à esquerda e à direita, não vejo no mundo uma força política capaz de reverter o que está acontecendo.

Os cataclismas já estão em curso — Portugal pega fogo todo ano, a Califórnia pega fogo todo ano, os países-ilha lá do Pacífico vão ser inundados, o Polo Norte está numa situação calamitosa, a quantidade de gelo que se perde por ano é gigantesca.

A humanidade tinha dois bilhões de pessoas até 1950, em vinte mil anos de história, dois bilhões de pessoas, de 1950 pra cá nós somos sete bilhões. Nesse ritmo não vai ter solução.

No trecho grifado, no alto, o escritor só falta dizer o nome novo coronavírus.

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Jornalista e escritor. Só sei que nada sei (Sócrates), mas desconfio de muita coisa (Riobaldo Tatarana).

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